Particularidades da dengue: do manejo de antiagregantes/anticoagulantes a exames confirmatórios

As hemorragias que ocorrem na dengue têm como fisiopatologia a disfunção endotelial e plaquetopenia, causada por supressão medular e destruição plaquetária periférica.

Na condução de pacientes com dengue e que façam uso prévio de antiagregantes e/ou anticoagulantes devido a comorbidades, surge a dúvida se mantemos ou não essas medicações.

O protocolo do Ministério da Saúde (MS) de 2024 indica a avaliação de dois parâmetros nesse cenário: se há hemorragia associada ou  se há plaquetopenia.  Quando houver hemorragia moderada a grave, sobretudo com instabilidade hemodinâmica associada, deve-se suspender imediatamente esses medicamentos, independentemente da indicação que motivou o início desses fármacos, já que o risco de agravamento e evolução para choque hemorrágico é grande, além de realizar transfusão de plaquetas na dose de 1UI/10kg de peso (se uso de dupla antiagregação) e/ou plasma fresco congelado na dose de 10-15ml/kg de peso (se uso de anticoagulantes).

Antiagregantes

Para pacientes com dengue que não apresentem sangramentos, mas que utilizam antiagregantes como profilaxia secundária para doença coronariana e/ou cerebrovascular, precisaremos avaliar o nível de plaquetas. Caso as plaquetas estejam acima de 50.000/mm³, mantemos a medicação, com reavaliação diária de sua contagem, o que pode ser feito em regime ambulatorial. Caso o nível de plaquetas esteja entre 30.000-50.000/mm³ podemos manter os medicamentos, mas, nesse caso, está indicada a contagem plaquetária diária em leito de observação ou internação. A suspensão de antiagregantes ou anticoagulantes em si só está indicada se o nível de plaquetas estiver menor que 30.000 /mm³, e nesses casos, a contagem plaquetária deve ser realizada diariamente em leito de observação ou internação.

Anticoagulantes

No que diz respeito a suspensão de anticoagulantes em cenários em que não há sangramento, a recomendação será baseada na avaliação conjunta do RNI, quando uso de antagonista de vitamina K (ou tempo de ativação da protrombina), e nível de plaquetas. Pacientes com plaquetas acima de 50.000/mm³ poderão ter a Varfarina mantida e ser acompanhados ambulatorialmente, com dosagem diária das plaquetas e RNI (podendo ficar terapêutico entre 2-3 ou até 2,5 a 3,5, sobretudo se o risco trombótico for alto, como em pacientes com próteses valvares metálicas).

Caso as plaquetas estejam entre 30.000-50.000/mm³, está indicado a internação para o controle da anticoagulação e avaliação diária, estando indicada também a suspensão da varfarina e início da Heparina Não Fracionada (HNF), cuja meia vida é menor, se RNI abaixo de 2. Contudo, se as plaquetas estiverem abaixo de 30.000/mm³, o risco de sangramento aumenta muito. Nesses casos, devemos internar e suspender a anticoagulação, com avaliação diária desses pacientes.

Caso o anticoagulante de uso prévio for um anticoagulante oral de ação direta (DOAC), como não há testes disponíveis para avaliar sua eficácia no SUS e se o risco de eventos tromboembólicos for grande, a recomendação é manter essas medicações se o valor da plaqueta estiver acima de 50.000/mm³. Se as plaquetas estiverem abaixo deste valor, recomenda-se internação e troca do DOAC para HNF, que deve ser iniciada após 24h da última dose do DOAC.

Diagnóstico – quando os exames confirmatórios são obrigatórios?

O Ministério da Saúde indica a realização de exames confirmatórios de dengue, e de caráter obrigatório, para os grupos de risco C (quando há sinais de alarme) e grupo D (quando há gravidade óbvia, manifesta por hemorragia importante, choque e/ou disfunção orgânica grave).

Vale lembrar que diante de uma suspeita diagnóstica elevada, sobretudo nesse cenário de epidemia, o resultado do exame não é essencial para o manejo do paciente. Contudo, às vezes, ter o exame confirmatório é muito importante para diagnóstico diferencial, mesmo em pacientes dos grupos A ou B, que se tratam de menor risco de evolução grave, como, por exemplo, em um paciente neutropênico com febre, cefaleia e milalgia. Além disso, é importante ressaltar que o resultado do exame do NÃO deve atrasar o início da hidratação.

Qual exame solicitar?

Solicitamos o antígeno NS1 até o 5º dia de sintomas e a sorologia (IgM/ IgG) a partir do sexto dia do início dos sintomas.

E quanto à prova do laço?

O protocolo atualizado deste ano do MS aponta que, em revisão sistemática recente, a prova do laço não foi capaz de predizer de forma acurada a evolução para formas graves e/ou indicação de hospitalização. Ainda assim, o Ministério da Saúde sugere a realização da prova do laço para a classificação dentro do grupo B. Uma prova do laço positiva não necessariamente será um prenúncio para as formas graves e nem indicativo de internação. Nossa avaliação, portanto, deve ser mais direcionada a avaliação dos sinais de alarme

Para saber mais, não deixe de escutar o episódio #173 em nosso podcast: Chama o plantão – Corrida de Leito.

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