O tromboembolismo pulmonar é uma das apresentações da doença venosa tromboembólica. A apresentação clínica é muito variável, fazendo com que o diagnóstico do tromboembolismo pulmonar seja um grande desafio médico. Esse texto responderá em 10 perguntas as principais questões relacionadas ao tromboembolismo pulmonar.
1) Qual a diferença entre embolia pulmonar e tromboembolismo pulmonar?
A embolia pulmonar é a obstrução da artéria pulmonar ou um de seus ramos por algum material originado em outra parte do corpo (ex. trombo, tumor, ar ou gordura). O tromboembolismo pulmonar se refere a obstrução desses vasos por um trombo.
2) Qual a incidência do tromboembolismo pulmonar e sua relação com a idade e sexo do paciente?
A incidência do tromboembolismo pulmonar é variável na literatura e vem crescendo nos últimos anos. Atualmente a incidência excede 1 para cada 1000 habitantes.
Acredita-se que a incidência do tromboembolismo pulmonar é crescente por diversos fatores, que incluem desde o envelhecimento da população, com aumento de neoplasias malignas e pacientes acamados , até a maior disponibilidade de métodos diagnósticos mais acurados, como a angiotomografia.
O tromboembolismo pulmonar é um pouco mais frequente em homens e sua incidência aumenta com a idade, chegando a mais de 5 por 1000 nos maiores de 75 anos.
3) Qual a mortalidade do tromboembolismo pulmonar?
Apesar da crescente incidência, a mortalidade está diminuindo, provavelmente devido ao diagnóstico mais precoce, melhora do suporte clínico e aumento do diagnóstico de pequenas embolias pulmonares subclínicas que não eram detectadas anteriormente.
A mortalidade intra-hospitalar em países desenvolvidos encontra-se em torno de 5% e a mortalidade em um ano chega a 13%. Importante ressaltar que ocorre aumento de mortalidade com a idade do paciente.
4) Qual a fisiopatologia do tromboembolismo pulmonar?
Ela é similar a patogênese da geração de trombos e é composta pela tríade de Virchow:
- Estase sanguínea;
- Lesão endotelial;
- Hipercoagulabilidade.
A combinação desses fatores predispõe a formação de trombo. Quando um êmbolo desse trombo se desprende e se aloja na artéria pulmonar ou em seus ramos, ocorre o tromboembolismo pulmonar. A maior parte dos êmbolos se origina na parte proximal dos membros inferiores.
A trombose venosa limitada as panturrilhas raramente causa embolia pulmonar e se resolve de maneira espontânea em 2/3 dos casos. No terço restante, ela tende a progredir para trombose proximal de membros inferiores, com risco de embolia.
5) Quais são os fatores de risco para tromboembolismo pulmonar?
Os fatores de risco podem ser divididos em genéticos e adquiridos.
Fatores Genéticos
- Fator V de Leiden;
- Mutação do gene da protrombina;
- Deficiência de proteínas C e S;
- Deficiência de antitrombina;
- Disfibrinogenemia;
- Hiperhomocisteinemia;
Fatores Adquiridos
- Trombose venosa profunda ou tromboembolismo pulmonar prévios;
- Imobilização maior que 3 dias;
- Hospitalização;
- Trauma ou cirurgia nas últimas 4 semanas;
- Tumores malignos e Síndromes Mieloproliferativas;
- Acesso venoso central;
- Gravidez, uso de contraceptivo oral e reposição hormonal;
- Tabagismo;
- Obesidade;
- Insuficiência cardíaca congestiva;
- Síndrome de anticorpo antifosfolípide;
- Doença inflamatória intestinal;
- Síndrome nefrótica;
- Anemia falciforme.
6) Quais são as manifestações clínicas do tromboembolismo pulmonar?
O tromboembolismo pulmonar possui uma ampla variedade de apresentações, podendo variar desde um achado ocasional em pacientes assintomáticos, até a morte súbita. Os sintomas mais comuns são:
- Dispneia;
- Dor torácica pleurítica;
- Tosse;
- Sintomas de trombose venosa profunda.
Os sinais mais comuns são
- Taquipneia;
- Taquicardia;
- Febre.
- Cianose.
Apresentações menos comuns são hemoptise, síncope e choque.
7) Como diagnosticar o paciente com tromboembolismo pulmonar agudo na emergência?
Devido a diversidade de manifestações clínicas e grande dificuldade diagnóstica, diante da suspeita de tromboembolismo pulmonar estratificar a probabilidade pré-teste do paciente. O escore de Wells é a ferramenta mais validada para esse fim:
A partir dessa probabilidade pode-se determinar qual seria o melhor teste diagnóstico, conforme os fluxograma abaixo adaptados do guideline da Sociedade Europeia de Cardiologia publicado em 2019 :
Pelo fluxograma acima vemos que o dímero D deve ser solicitado nos pacientes com probabilidade baixa ou intermediária de tromboembolismo pulmonar e, caso ele venha negativo, o diagnóstico de tromboembolismo pulmonar estaria excluído. Nos pacientes com alta probabilidade, o dímero-D não deve ser solicitado. Deve-se ir diretamente para exames confirmatórios como a angiotomografia de tórax ou a cintilografia de ventilação perfusão. Vale ressaltar que diante da alta suspeita clínica não se deve aguardar o resultado do exame confirmatório para o início do tratamento.
Observe que nos casos de pacientes instáveis, caso não seja possível realizar a angiotomografia, pode ser realizado tratamento específico de tromboembolismo pulmonar, incluindo trombólise, pelo achados de sinais de sobrecarga ventricular direita ao ecocardiograma. Vale ressaltar que essa avaliação pode ser feita a beira do leito pelo médico emergencista ou intensivista com o uso do ultrassom. Nesse momento também pode ser avaliada a presença de trombose venosa profunda pela técnica de compressão de 3 pontos. A CUREM oferece o curso USEM, no qual essa e outras habilidades com o ultrassom são praticadas.
8) Como estratificar o risco do paciente com tromboembolismo pulmonar?
A estratificação de risco dos pacientes com tromboembolismo pulmonar é uma etapa essencial do tratamento. Ela será determinante para a escolha do ambiente de tratamento e determinação da melhor terapia.
Os pacientes instáveis hemodinamicamente são classificados como alto risco. Para os demais, pode ser utilizado o escore PESI descrito na tabela abaixo.
Os pacientes estáveis hemodinamicamente e com escore PESI classe I a II ou PESI simplificado = 0 são classificados como baixo risco.
Os pacientes com escore PESI superior a esses valores podem ser classificados como risco intermediário baixo ou alto, baseado nos valores de marcadores de sobrecarga de ventrículo direito (Troponina e BNP) e avaliação ecocardiográfica.
9) Como tratar conforme a estratificação de risco:
Baixo risco: Pode ser considerado tratamento domiciliar com o uso de novos anticoagulantes orais ou hospitalização breve.
Risco intermediário baixo: Internação e início de anticoagulação parenteral ou novos anticoagulantes orais.
Risco intermediário alto: Internação e uso de anticoagulação parenteral. Pode ser considerada trombólise, porém o benefício ainda é controverso.
Alto risco: Internação. Uso de heparina não-fracionada e trombólise na ausência de contraindicações.
Novos anticoagulantes orais
1. Inibidor de fator Xa
- Rivaroxabana: 15mg de 12 em 12 horas por 21 dias, seguido de 20 mg por dia.
- Apixaban: 10 mg de 12 em 12 horas por 7 dias, seguido por 5 mg por dia.
- Inibidor direto de trombina: Dabigatran 150mg de 12 em 12 horas.
No caso da escolha pelo Dabigatran, o paciente deve receber pelo menos 5 dias de heparina antes do início deste medicamento.
2. Varfarina
Nos pacientes de baixo risco ou risco intermediário baixo a Varfarina pode ser iniciada já no primeiro dia junto ao uso de Enoxaparina, Heparina Não-Fracionada ou Fondaparinux. Nos demais pacientes deve-se aguardar a evolução inicial do quadro.
Iniciar com a dose de 5 mg por dia e ajustar dose até obtenção de RNI em faixa terapêutica(2-3).
Fibrinólise
Nos pacientes de alto risco (instáveis hemodinamicamente) ou risco intermediário alto, pode ser considerada a Trombólise.
O benefício da trombólise é muito bem estabelecido nos pacientes de alto risco. Já nos pacientes de risco intermediário alto, o benefício é questionável e essa decisão pode ser tomada nos primeiros 14 dias (janela de trombólise do tromboembolismo pulmonar). É importante ressaltar que sempre antes da administração do trombolítico deve ser avaliada a presença de contraindicações relativas e absolutas.
10) Por quanto tempo deve ser mantida a anticoagulação no tromboembolismo pulmonar agudo?
A anticoagulação oral deve ser mantida por pelo menos 3 meses. Em pacientes selecionados a anticoagulação pode ser estendida levando em consideração fatores como:
- Episódio provocado (ex. pós trauma ou cirurgia) ou espontâneo;
- Risco de recorrência;
- Tolerância ao tratamento;
- Risco de sangramento;
- Presença de trombofilia.
Os fatores para auxiliar nessa decisão podem ser consultados no guideline da CHEST
Referências
1 – Konstantinides SV. 2019 ESC Guidelines for the diagnosis and management of acute pulmonary embolism developed in collaboration with the European Respiratory Society (ERS) . European Heart Journal (2019) 00, 1-61. doi:10.1093/eurheartj/ehz405
2 – Kearon FC et al. Antithrombotic Therapy for VTE Disease: CHEST Guideline and Expert Panel Report. Chest. 2016 Feb;149(2):315-352. doi: 10.1016/j.chest.2015.11.026. Epub 2016 Jan 7.