Troponina aumentada é sinônimo de Infarto Agudo do Miocárdio?

A quarta definição universal do infarto agudo do miocárdio (IAM) publicada conjuntamente pela American Heart Association (AHA), American College of Cardiology (ACC) e pela European Society of Cardiology (ESC) fez diversas atualizações importantes na definição de IAM que havia sido publicada anteriormente no ano de 2012. Nesse contexto, a clara diferenciação entre IAM e lesão miocárdica (LM) chama atenção. 

Alta concentração de troponina

Uma alta concentração de troponina sérica durante muito tempo foi quase sinônimo de IAM. Apesar disso, com o desenvolvimento de kits de troponina cada vez mais sensíveis, naturalmente a especificidade para o diagnóstico de IAM segundo qualquer aumento desse marcador de necrose miocárdica diminuiu. Elevações séricas de troponina sem que haja lesão miocárdica isquêmica têm sido mais comuns e para essa entidade nosológica deu-se o nome de lesão miocárdica (do inglês: myocardial injury). Tal diferenciação é interessante de ser avaliada pois a própria lesão miocárdica apesar de aparentemente mais “inocente”, pode estar associada a prognósticos tão ruins quanto o IAM.

Lesão miocárdica

Evidências atuais sugerem que a lesão miocárdica represente cerca de 60% dos casos de elevação de troponina e que cerca de 1 a cada 8 pacientes internados apresentariam LM, sem que tenha necessariamente ocorrido um IAM

A análise de prognóstico da LM demonstra uma mortalidade de até 70% dos pacientes em 5 anos, com uma taxa de ocorrência de evento adverso cardiovascular de 30% no mesmo período.

Quando eu devo pensar em LM? LM é definida como concentrações de troponina acima do percentil 99 do limite superior de normalidade, sem que se tenha o diagnóstico de IAM. E o que causa a LM? Na verdade a gama de diagnósticos diferenciais é extensa e didaticamente podemos dividir os casos em causas crônicas e causas agudas. 

O primeiro passo é, naturalmente, excluir a presença de um IAM propriamente dito. Posteriormente, a avaliação de uma história clínica minuciosa, associada à exame físico detalhado e complementado com exames laboratoriais e de imagem específicos pertinentes, guiam o raciocínio diagnóstico. 

Baixas concentrações séricas de troponina, mas com valores acima do limite superior de normalidade compõe a maior parte dos casos encontrados na prática clínica.

Aumentos expressivos no valor de troponina sérica são progressivamente mais específicos quanto maiores, ou seja, quanto maior a alteração do marcador, maior o valor preditivo positivo para IAM. E para se diferenciar a LM de qualquer IAM, é necessário excluir qualquer evidência clínica de isquemia.

O diagnóstico de isquemia miocárdica requer pelo menos 01 dos seguintes sinais/sintomas:

  • Sintomas de doença isquêmica- sejam sintomas clássicos ou equivalentes anginosos bem determinados no contexto em questão-;
  • Alteração eletrocardiográfica aguda;
  • Novo déficit mecânico identificado em exame de imagem – como por exemplo, novo déficit de contratilidade em uma parede específica do coração ao exame de ecocardiograma-;
  • Trombose coronária diagnosticada via angiocoronariografia percutânea – o famoso cateterismo ou CATE.

Ainda não temos um consenso sobre o tratamento de pacientes com LM, sendo importante e fundamental a definição da causa subjacente e o seu tratamento específico.

Já para IAM, é importante diferenciarmos os cinco possíveis tipos de infarto:

  • Tipo 1: isquemia miocárdica causada por ruptura de placa, ulceração ou dissecção;
  • Tipo 2: isquemia miocárdica atribuída ao baixo aporte de oxigênio ao músculo cardíaco, ou seja, quando a demanda por oxigênio é maior que a oferta;
  • Tipo 3: Morte súbita que provavelmente seja secundária à um evento coronariano isquêmico;
  • Tipo 4: infarto do miocárdio associado à intervenção coronária percutânea ou secundário a trombose de stent;
  • Tipo 5: infarto do miocárdio associado a cirurgia cardíaca.

Sobre o tratamento do IAM, temos evidências robustas de como devemos conduzir o IAM tipo 1 (iremos discutir esse tema detalhadamente em um outro post). Já sobre o manejo do IAM tipo 2, a recomendação atual é individualizar o cuidado e corrigir a alteração que está fazendo com que haja um aumento de demanda (por exemplo: taquicardia, hipotensão, anemia, dentre outros).

Conclusão

Para finalizar, é importante termos em mente que existem diferentes kits para mensuração dos níveis séricos de troponina. Logo, os valores de referência devem ser individualizados. No que diz respeito aos testes disponíveis atualmente, quanto mais sensíveis, menos específicos e maior chance de nos depararmos com pacientes que estejam sofrendo uma injúria miocárdica seja ela aguda ou crônica. Fique atento a isso sempre que se deparar com um paciente desses na prática clínica. Fica a dica!

Referências

1- ThygesenK,AlpertJS,JaffeAS,etal;Executive Group on behalf of the Joint European Society of Cardiology (ESC)/American College of Cardiology (ACC)/American Heart Association (AHA)/World Heart Federation (WHF) Task Force for the Universal Definition of Myocardial Infarction. Fourth universal definition of myocardial infarction (2018). J Am Coll Cardiol. 2018;72(18):2231-2264. 

2- McCarthy, CP; et al.; Myocardial Injury in the Era of High-Sensivity Cardiac Troponin Assays – A practical Approach for Clinicians. JAMA. 2019;

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